ESTUDO PILOTO DA RELAÇÃO ENTRE O JULGAMENTO DE TRAÇOS LINGUÍSTICOS E EXPRESSÕES FACIAIS
Advindo da Psicologia Social, atitude é um constructo psicológico que corresponde à disposição que as pessoas têm para reagir favorável ou desfavoravelmente a um objeto psicológico (Allport, 1935; Thurstone, 1996; Sarfroff, 1970). Esta reação pode se expressar de diferentes formas, como nas expressões faciais, que sinalizam emoções. Associando a mensuração de atitudes por meio de expressões faciais, é possível ampliar o escopo do entendimento de como traços linguísticos são avaliados socialmente: ou seja, expressões faciais e as emoções a elas vinculadas podem funcionar como pistas/indicadores da avaliação social que dada comunidade linguística atribui a determinado traço da língua. Para testar a relação entre expressão facial e o julgamento dos falantes acerca de um traço linguístico, elaboramos um estudo experimental com o rotacismo, fenômeno fonológico no qual ocorre a troca da consoante lateral [l] pela vibrante alveolar [r], que é apontado por estudos sociolinguísticos acerca da produção como um traço descontínuo no português brasileiro (Bortoni-Ricardo, 2003), sendo alvo de estigma e preconceito, por ser associado ao falar rural, de classes sociais mais baixas e de menor nível educacional. Foi elaborado um experimento piloto de julgamento de falantes, em que os juízes, nove estudantes universitários da Universidade Federal de Sergipe, no estado de Sergipe, Brasil, realizaram a tarefa de ouvir e julgar cada um dos estímulos (duas frases com o estímulo-alvo, duas frases com uma ocorrência de rótico e outra do estímulo-alvo, duas frases sem o estímulo-alvo) em uma escala de 7 pontos quanto ao nível de agradabilidade da fala. O teste foi executado com o software OpenSesame, v. 3.1 (Matôt et al., 2016) e ao mesmo tempo em que as respostas e o tempo de reação eram registrados, foram registradas em vídeo as expressões faciais dos participantes. Posteriormente, os dados de vídeo foram submetidos a um script em linguagem Python (Van Gent, 2016) cujo algoritmo extraiu 68 pontos (localizados nas linhas das sobrancelhas, boca, nariz, olhos e queixo) do rosto de cada participante enquanto eram realizadas as tarefas de julgamento, O arranjo dos pontos permitiu a categorização das faces detectadas em “ironia”, “asco”, “neutro”, “medo” e “surpresa”. Os dados de julgamento e de expressão facial foram submetidos a uma análise de variância. O efeito principal do julgamento quanto ao tipo de estímulo [F(2,51)=17,92, p>0.0001]: a média de julgamento para os estímulos com rotacismo (1.88) é menor do que a com rotacismo e rótico (3.33), que, por sua vez, é menor do que a dos estímulos sem rotacismo (7.77). Embora não tenham sido estatisticamente significativas (possivelmente em função da amostra ser muito pequena), a emoção predominante com os estímulos com rotacismo foi a “ironia” (30.94%), enquanto a expressão facial “neutro” foi predominante com os estímulos sem rotacismo (66.27%). Esta distribuição reforça o status atribuído ao fenômeno linguístico do rotacismo, que é considerado na comunidade linguística brasileira um traço descontínuo e avaliado negativamente, sendo objeto de preconceito. Este estudo piloto aponta para a viabilidade da articulação entre a expressão facial e o julgamento consciente de um traço, o que pode ser promissor nos estudos de percepção sociolinguística.
Bruno Felipe Marques Pinheiro / Lucas Santos Silva / Paloma Batista Cardoso / Victor Renê Andrade
Pesquisadores Graduados do Grupo de Estudos em Linguagem, Interação e Sociedade (GELINS)