Reconhecido em 2005 pelo Ministério da Justiça como ex-preso político com lesão permanente sofrida em estabelecimento militar no auge do arbítrio (1970), tendo sofrido acentuados danos físicos, psicológicos, morais e profissionais como consequência da prisão e torturas, deveria no prazo de dois meses ter recebido uma indenização retroativa referente aos 35 anos transcorridos entre as arbitrariedades que sofri nas mãos de agentes do Estado e a pensão que a União começou a me pagar em 2006.
No entanto, mais de um ano se passou sem que as autoridades iniciassem o pagamento ou dessem alguma satisfação sobre o motivo de não o fazerem. Entrei com mandado de segurança para que fosse respeitado meu direito e, cerca de um mês depois, todos os anistiados recebemos uma carta da União, sem justificativa nenhuma: deveríamos assiná-la e mandá-la de volta, concordando com o parcelamento do nosso crédito por mais de 8 anos.
Depois de ter meu sangue derramado e quase morrer resistindo ao autoritarismo da ditadura, considerei que aceitar um ultimato desses seria desmerecer a luta que eu e meus companheiros (muitos dos quais não sobreviveram) havíamos travado em condições tão desiguais. Então, fui adiante com o mandado de segurança.
Todos que recorremos à Justiça vimos o desfecho sendo postergado por infinitos embargos de declaração e outras medidas que apenas adiavam a concretização da justiça, sem mudarem em nada o conteúdo das decisões, sempre em nosso favor.
Daqui a um mês essa lengalenga completará 11 anos e continua inconclusa. Como nunca dispus da quantia que precisava para sair do aluguel e equilibrar minhas finanças, acabei chegando no meu limite no final de 2018, tendo de tomar a decisão extrema de aceitar que minha esposa e minha filha passassem a morar num esquema da família dela, enquanto eu ficarei sozinho até conseguir dar a volta por cima.
A vaquinha é para custear a transição, principalmente o aluguel de uma quitinete, pois me está sendo impossível até arcar com o depósito-caução.
Mas, quaisquer que sejam as decepções e os obstáculos à minha frente, enquanto tiver forças e lucidez continuarei defendendo os ideais que assumi há mais de meio século e dos quais nunca abri mão.